quarta-feira, setembro 30, 2009

Que discurso...!?

(Maria e Aníbal)











QUE DISCURSO...!?


As opiniões de dois conceituados Jornalistas portugueses sobre o "discurso" do PR

Quem estava à espera de que o presidente da República viesse falar de segurança, enganou-se. Cavaco Silva falou de política. E falou alto, pois acusou "o partido do Governo" - sem nomear quem - de ter "ultrapassado os limites do tolerável e da decência", acusou-o de ter manipulado, de lhe ter dirigido um ultimato, tudo com o objectivo de "desviar as atenções" das questões que preocupavam os cidadãos e de o "encostar ao PSD".

Estas são as acusações. Ouvidas e lidas, fica-se sem perceber como irão presidente e primeiro-ministro recém-confirmado pelas urnas entender-se, como pode o presidente trabalhar com o líder de um partido que manipula, que passa dos limites. Felizmente, o PS foi ponderado na resposta, limitando-se a justificar ponto por ponto as acusações que lhe eram dirigidas, desmontando-as, e resistiu à tentação de manter o clima de guerra. Mas não há nada a esperar de bom nas relações S. Bento-Belém, a cooperação institucional não passa já de um conceito. De agora em diante, o Parlamento, os partidos e o Governo têm nas suas mãos a responsabilidade acrescida de garantir a estabilidade do país. Depois do discurso de ontem, Cavaco vê muito reduzida a sua capacidade de intervir na qualidade de árbitro.

As acusações avançadas não estão fundamentadas pelo discurso do presidente: o discurso é frágil e até ele mesmo manipulador, pois fala num assessor que não é o seu próprio assessor, trazendo à colação um colaborador do primeiro-ministro que, em toda a parte da história das escutas é personagem menor. Pior: o discurso, além de confuso, não é claro no essencial. Cavaco diz que ninguém fala em seu nome, a não ser o chefe da Casa Civil ou da Casa Militar, diz ter dúvidas que o seu assessor - finalmente fala no seu assessor- o tenha feito mas procedeu a alterações na sua Casa Civil. Ou seja: Fernando Lima, o assessor de Cavaco, pode nada ter feito de mal, mas mesmo assim é afastado e o presidente não achou importante vir dizer, antes, em cima da revelação do email, que tudo era uma manipulação. Misturando emails - um de enorme gravidade revelado no DN e os seus próprios, que não vinham a propósito -, prossegue na confusão. Queríamos saber de escutas, mas Cavaco diz que chamou especialistas e que ficou a saber que existem vulnerabilidades no seu computador. A sua preocupação com as escutas era esta? Alhos e bugalhos misturados num discurso que visava resolver um problema e que arranjou outro bem pior! Qualquer pessoa sabe que um computador não é cem por cento invulnerável, até o Pentágono já foi vítima de intromissões.

O discurso do presidente é desequilibrado e confuso, ambíguo, inoportuno e nada claro: as acusações são directas, mas o que queríamos ver explicado está em meias-palavras. É infantil, e por isso nos deixa a todos perplexos. Patético. Politicamente, Cavaco deu ontem um passo decisivo para encerrar a sua carreira sem direito a segundo mandato. Fá-lo da pior forma, aliás.

Director do Jornal de Noticias
José Leite Pereira

Primeiro que tudo: recomendo a leitura e a releitura da comunicação de ontem do Presidente da República. Até porque este está longe de esclarecer tudo para além de dois factos essenciais: Cavaco Silva considera que o partido do Governo tentou puxá-lo "para a luta político-partidária" e procurou "desviar as atenções do debate eleitoral das questões que realmente preocupavam os cidadãos".

Mais: o Chefe de Estado considera que isso começou a acontecer a meio de Agosto, classificando as declarações de alguns dirigentes do PS como "um tipo de ultimato dirigido ao Presidente da República".
Para quem não se recordar, foi por causa dessas declarações de dirigentes socialistas que o PÚBLICO contactou os serviços da Presidência da República, onde uma fonte oficial se interrogou sobre se os assessores de Cavaco Silva não estariam a ser vigiados. O Presidente não desautorizou ontem os membros da Casa Civil que falaram ao PÚBLICO: disse que só ele fala em seu nome - ele os chefes da Casa Civil e da Casa Militar; e acrescentou que não constituía "crime" formular interrogações sobre as "declarações políticas de outrem", nisso incluindo mesmo "as interrogações atribuídas a um membro da minha Casa Civil" "sobre como é que aqueles políticos sabiam dos passos dados por membros da Casa Civil da Presidência da República".

Mesmo sem assumir os termos exactos em que as interrogações chegaram à imprensa (e não foi só pelo PÚBLICO), o Presidente nunca as desautorizou - e isso deixou por explicar ontem. Contudo, disse que "não cede a pressões nem se deixa condicionar, seja por quem for". Uma frase importante que me obriga a recordar o que escrevi no dia 19 de Agosto: "O terreno está movediço e o Presidente quer preservar a sua autoridade e autonomia, pois sabe que há sombras de tempestade no horizonte. Só isso pode explicar que tivesse deixado que se soubesse que receia que nem todos os jogadores estejam a jogar com cartas limpas."

Ontem ficou claro que Cavaco Silva receava que o partido do Governo não estivesse a fazer jogo limpo. Tão cristalinamente claro que é difícil imaginar em que condições o Presidente da República e o primeiro-ministro vão conseguir cooperar num momento difícil para o país.
Ontem também ficou claro que o Presidente da República não geriu bem este caso. Mas lá iremos.
É certo que o Presidente da República nunca disse, de viva voz, que temia estar a ser vigiado. Mas disse que, a seguir à campanha eleitoral para as legislativas, falaria "sobre questões de segurança". Para quem não se recorde, essa declaração foi feita no dia em que o Diário de Notícias cometeu duas faltas deontológicas gravíssimas: primeiro, violou correspondência privada trocada entre profissionais do PÚBLICO; segundo, fê-lo para expor uma fonte deste jornal.

Cavaco Silva estranhou esse comportamento - "porque é que é publicado agora, a uma semana do acto eleitoral, quando já passaram 17 meses?" - e viu em tal decisão um novo sinal do esforço para "colar o Presidente ao PSD e desviar as atenções". Porque ligou "imediatamente a publicação do e-mail aos objectivos visados pelas declarações produzidas em meados de Agosto". As tais declarações de dirigentes do partido do Governo...

E a seguir acrescentou que essa publicação desse e-mail privado lhe suscitou a seguinte dúvida: "Será possível alguém do exterior entrar no meu computador e conhecer os meus e-mails? Estará a informação confidencial contida nos computadores da Presidência da República suficientemente protegida?" Ou seja, tornou claro que, se antes ainda podíamos circunscrever as suspeitas a alguns dos seus colaboradores, o Presidente assumiu ontem que, pelo menos desde a publicação do e-mail, também ele teve dúvidas sobre a segurança da sua própria correspondência. Dúvidas que o levaram a chamar especialistas que o informaram que existem vulnerabilidades no sistema de comunicações pela Internet de Belém. O que é grave e deve ser esclarecido depressa - pela Presidência e pelos serviços de segurança portugueses.

Fica assim tudo esclarecido? Longe disso. O Presidente disse que, "passada a disputa eleitoral, e porque considero que foram ultrapassados os limites do tolerável e da decência", decidiu "partilhar", "em público", "a interpretação que fiz sobre um assunto que inundou a comunicação social durante vários dias". Só que essa interpretação não chegou para esclarecer os portugueses.
Recorro por isso, de novo, ao que já escrevi, desta vez a 22 de Setembro: "Das duas, uma: ou a seguir a 27 de Setembro fundamenta as suas suspeitas, e age em conformidade, ou, se se limitar a iniciativas pífias, terá enfraquecido a sua autoridade como Chefe de Estado, porventura de forma irremediável". Infelizmente não fundamentou de forma consistente as suas suspeitas - nem clarificou bem que suspeitas tinha, ou tem - e, tendo sido forte no ataque aos que acusou de o tentarem condicionar e envolver na campanha, a única iniciativa tomada, sobre segurança informática, fica muito aquém do clima que, porque o desejou ou porque não o evitou, deixou criar.
Esta intervenção, a par com a não intervenção mais cedo, tem consequências. Umas o Presidente já as assumiu: o seu comportamento pode-lhe "causar custos pessoais". Outras deverão ser mais pesadas, pois sai ferido deste processo numa altura em que sabe que terá de continuar a lidar com um primeiro-ministro em que, manifestamente, não confia.
Quanto ao PS, pela voz de Pedro Silva Pereira, este decidiu assumir o conflito. O que significa que esta história não acaba aqui - muito longe disso. Não são boas notícias para o país, sobretudo no momento que vive.

José Manuel Fernandes
Director do Público



6 comentários:

Anónimo disse...

O PR pirou...

Anónimo disse...

Cavaco Silva mostrou que é um bom pistoleiro, mas como dizia o falecido Agostinho da Silva (o pensador e ensaísta, não estou a falar daquele que quer poleiro na Câmara pra ver se engorda outra vez... ele que fique lá com o seu Mar, de preferência no fundo:

"Falar sem pensar é como atirar sem apontar..."

Creio que desta vez levou um tiro no próprio pé.
Olha me em que confusão te metes te Cavaquito. Os teus tempos de Primeiro Ministro já acabaram... e por este andar os de Presidente vão pelo mesmo caminho.
Então não quiseste falar antes das eleições - pensavas que a velha ganhava não era - esqueceste q estamos ainda em período de eleições, então vai de lanchar umas larachas pra ver ganham nas câmaras, pra depois dizeres que o Governo não tem condições...
OLHA QUE O POVO JÁ NÃO É TODO BURRO E CEGO... ASSIM É QUE TE COLAS MESMO AO PPD (... se é q alguma vez te descolaste!)

Ai Cavaquito cavaquito...Tamos lixados contigo

Socras "il specialle" disse...

porreiro pá...

seixomirense disse...

Como Alberto joão Jardim referiu, isto é um país de doidos.

Mao disse...

01.10.2009 - 16h49 Lusa
O secretário-geral do PS, José Sócrates, esteve cerca de 45 minutos reunido com o Presidente da República e à saída limitou-se a dizer aos jornalistas que “foi uma boa conversa”.

Próxima polémica: de onde vai partir a fuga de informação

Amanhã, se não for hoje, vamos saber tudo o que se passou naquela sala durante 45 minutos. A polémica vai estalar outra vez sobre quem foi o autor da fuga de informação. Estiveram os dois sozinhos lá dentro? É que se estiveram, quem contar cá para fora estará mesmo a «esticar a corda».
Para já, Sócrates chegou com 20 minutos de atraso. Que é para verem quem manda aqui... ahahahhah

Carlos Monteiro disse...

O Presidente da República não disse nada de essencial para o esclarecimento da história das escutas. Ou seja, acabou por pouco dizer e ainda menos esclarecer, o que significa que a história das escutas não passou de uma invenção de assessores da presidência, como toda a gente supunha. Daí a declaração atabalhoada do Presidente assente em «interpretações pessoais» e escamoteando o facto principal que desencadeou a «história». Não se percebe porque deixou esta trapalhada para depois das eleições, visto que para não dizer nada, também poderia ter falado antes.
O homem que nunca se engana e raramente tem dúvidas, fez o pleno das críticas dos comentadores e fragilizou-se ainda mais. Bem pode dizer que "Portugal está primeiro" e tentar justificar-se que não consegue iludir o essencial: esta polémica resulta apenas de o PR não ser capaz de desfazer sem tibiezas nem artifícios um problema montado por um dos seus assessores.