sexta-feira, novembro 24, 2006

Mercado imobiliario e politica de solos

Mercado imobiliário e política de solos
Não basta que existam planos de ordenamento territorial. É fundamental que se promova uma cultura de respeito pelo interesse público, ao contrário das práticas hoje dominantes. A esmagadora maioria dos loteamentos apresentados a licenciamento visa aumentar indiscriminadamente os índices de ocupação e construção. As autarquias colaboram no processo, através de planos e engenharias financeiras para rentabilizar os terrenos públicos. O estado actual das finanças locais também torna as autarquias demasiado dependentes das receitas de urbanização. O resultado está à vista: uma enorme pressão especulativa sobre o território e uma excessiva prioridade à construção nova sobre a reabilitação e requalificação.
O mercado de solos e do imobiliário é aliás, neste momento, um dos mercados mais desregulados e, ao mesmo tempo, mais bloqueados em Portugal, o que parece um paradoxo, mas não é. O Estado tem de desempenhar um papel importante para tornar este mercado mais transparente e melhor regulado. É necessário criar instrumentos legais e financeiros que permitam às autarquias disponibilizar terrenos urbanos ou urbanizáveis a preços acessíveis, nos locais indicados. É imprescindível promover a reforma fiscal do património imobiliário, uma das áreas onde há, simultaneamente, maior evasão e maiores sobrecargas. E é necessário disponibilizar informação imparcial e actualizada sobre os valores das transacções, nomeadamente as que envolvem entidades públicas, que deveriam servir como valores de referência para regular o mercado e não serem elas próprias, como tantas vezes são, factores de especulação. Há a necessidade de o planeamento não ser apenas visto como uma questão de espaço, mas também de tempo, havendo um controlo público da expansão urbana, por exemplo, em vez de estar determinantemente dependente das iniciativas privadas, nomeadamente dos proprietários dos terrenos “para construção”.
À semelhança do que acontece na generalidade dos países europeus, não é aceitável a apropriação privada do essencial das mais valias geradas com o financiamento por fundos públicos de infra-estruturas e equipamentos. Nem pode a totalidade ou parte dessas mais-valias, embora apropriada pelos poderes públicos, deixar de se traduzir em receitas (e correspondentes despesas) devidamente registadas nos orçamentos, como acontece frequentemente com negócios entre Câmaras e particulares, “jogando” com loteamentos ou autorizações para construir. Os negócios com os clubes de futebol são, nesta matéria, um particular mau exemplo. A preocupação com este tipo de “desorçamentação” é tanto mais pertinente quanto é possível prever que, em contexto de dificuldade e de contenção financeira geral, aumente a tendência para os municípios procurarem formas de “arranjos” atípicos, com vista à obtenção de fundos financeiros acrescidos.
A regulamentação do mercado imobiliário implica ainda uma redefinição clara das responsabilidades e das exigências profissionais de todos os agentes envolvidos no processo construtivo. Só nesse quadro se poderão combater a má qualidade da construção, o elevado grau de proliferação de situações irregulares.
É indispensável a elaboração de cartas de solos que permitam a implementação, aos níveis municipal, regional e nacional, de uma verdadeira política de solos e de ordenamento do território.
Carlos Monteiro

3 comentários:

Anónimo disse...

Assim como empreendimentos à beira da lagoa?Ou empreendimentos turísticos em reseva agrícola como a Herdade do Lago Real?Vá la Sr Carlos. Segrede este texto ao ouvido do Dr. reigota. muitas vezes muitas vezes. Ia-lhe fazer tão bem.

Anónimo disse...

A exposição, com que C. Monteiro nos brinda, mostra uma vez mais o quanto questões aparentemente sem nada que discutir, são no nosso país sempre tema de conversa, e no nosso concelho á beira mar plantado atingem um plano ainda mais notório pois os intervinientes são locais e sobejamente conhecidos da sociedade.
Ao assistirmos ano após ano a um cada vez mais numero de habitantes, assistimos paralelamente a uma necessidade elementar das familias, a casa, habitação, lar ou o que lhe queiramos chamar. O que no pais de Portugal até ajuda, pois nao fosse a nossa construção civil um dos mais empregadores da nação. O tambem nos leva a uma reflexão, se a construção para, se as obras publicas diminuem, se a maquina, e tão bem oleada que ela está, para e enferruja, para onde irão esses pedreiros, serventes, e encarregados de construção civil?
Como vai ser a subsistencias dessas familias?
O equilibrio será a solução possivel creio, mas sei quão dificil será gerir toda esta situação, quer a nivel local, quer nacional. Muito esta certamente em jogo, e a "pressão do betão" não para, não pode parar... e nem vai parar.

Como nota de rodapé, as construção que se iniciram no mandato de João Reigota já começam a dar que falar, se mudassem os intervinientes provavelmente seriam outras as vozes, é assim...

Anónimo disse...

É um verdadeiro escândalo o que se passa no mercado imobiliário onde a especulação atinge níveis inadmissíveis. Afinal, a mão invisível tão cara aos neoliberais apenas serve às mil maravilhas aos especuladores que só pensam em enriquecer depressa e bem à custa de milhares de famílias portuguesas. A habitação é uma área onde o Estado deve assumir um papel regulador e interventor.
O estado não pode alhear-se da sua função reguladora do mercado nem ignorar as carências habitacionais, sobretudo das camadas média/baixa da população insolvente.
Aliás, deve ser para estas camadas populacionais que o Estado deve orientar prioritariamente a sua política habitacional.
A especulação com os terrenos para habitação é uma situação insustentável a que urge pôr cobro, sendo inadmissível que, por exemplo, de acordo com um recente estudo, no nosso país existem cidades, que são as mais caras do mundo em termos habitacionais.
Isto num país como o nosso é inacreditável!